Estava a caminho de uma gráfica e passei por um homem vendendo cadeados, e fiquei pensando, será que alguém ainda compra cadeados? Será que é possível sobreviver vendendo cadeados? De repente ouvi aquela voz grave interrompendo meus devaneios : "_Estou solteiro, quero casar, estou na pista." Me deu vontade de rir. Como ele conseguiu no mesmo instante, me despertar compaixão e riso? Acho que só alguém muito humano tem esta capacidade, de estar livre vendendo algo destinado a prender, guardar, deixar seguro e ser livre na sua expressão, na sua subjetividade, mantendo o seu pensamento lúdico e engraçado. Não estou desmerecendo o trabalho digno dele e sim enaltecendo esta qualidade de algumas pessoas de tocarem violino com o barco afundando, pessoas que saem do drama para a comédia de maneira magistral e conseguem fazer um recorte da realidade, por mais dura que seja, não levam a sério este tabuleiro de peças esquisitas que é a realidade. Uma hora entendemos toda as peças e tudo se encaixa e em outros momentos, tudo fica absurdo e incoerente.
Para mim, era um homem em pleno exercício de resistência. Lembrei de Clarice Lispector:
" Estou sendo alegre neste mesmo instante porque me recuso a ser vencida: então eu amo. Como resposta."
Este é o meu cartão de visitas, achei lindo.
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