Organizar a Cabeça

Uma frase de Albert Camus me conduziu certa noite quando me sentei para "organizar a cabeça": "… o meu apetite para o absoluto e a unidade …". Para mim, ele descreveu de forma profunda a necessidade de se construir um sentido na vida. Em "O Mito de Sísifo" (Le Mythe de Sisyphe, 1942),ensaio sobre o absurdo, me salvou muitas vezes da queda.Porque sempre chega a mim o absurdo da vida, suas contradições e as tarefas sem sentido.Ele afirma que a "… contradição deve ser vivida …", que devemos abraçar a vida com paixão.Antoine Artaud** escreveu em “O Teatro e seu Duplo" (Le Théâtre et son Double, 1935),uma das obras mais importantes sobre a Arte do teatro no século XX: "(…) Se falta enxofre à nossa vida,ou seja, se lhe falta uma magia constante, é porque nos apraz contemplar atos e nos perderem considerações sobre as formas sonhadas de nossos atos, em vez de sermos impulsionados por eles.E essa faculdade é exclusivamente humana. Diria mesmo que é uma infecção do humano que nos estraga idéias que deveriam permanecer divinas; pois, longe de acreditar no sobrenatural,o divino inventado pelo homem, penso que foi a intervenção milenar que acabou por nos corromper o divino (…)".Eu, imagino ainda sobre outros encenadores que buscaram e pesquisaram vários mundos para reinventar o teatro,a dança e a Arte em geral. A necessidade de relacionar signos, rever a mágica do tempo e do espaço.Romper com o estabelecido para devolver ao ser humano a capacidade de sonhar.Escrevo sobre Arte porque Arte é minha matéria-prima. É por meio da Arte que estabeleço o diálogo com minha porção secreta e misteriosa. A contradição mais óbvia e feliz, e que achei muito bem definida num livro sobre o teatro, foi a comparação entre uma vela que se consome, ao próprio ato de criar a luz.Diante da vida que é cheia de ilusões e desilusões, para a nossa sobrevivência emocional, a Arte é um canal que nos convida a entrar em contato com o efêmero, o inefável, e nos preenche por alguns instantes do vazio de uma existência que nos permite pouco tempo para a contemplação ou observar nosso mundo interior.Muita informação e o excesso de automatismo nos roubam a alma e a qualidade da presença.A viver o Aqui e o Agora. Viver a experiência do rito de observar um corpo contar uma história,de revisitar memórias envelhecidas e esquecidas pelo tempo. Porque o tempo da Arte é a eternidade.Ela, a Arte, constitui e é realizada na tentativa do ser humano em se eternizar.Todas civilizações encontraram suas formas de fazer sentido, de permanecer e acreditar na força do Humano. *Albert Camus (7/11/1913 - Dréan, Argélia – 4/01/1960, Villeblevin, França). Dramaturgo, filósofo, jornalista, escritor, romancista e ensaísta.* **Antoine Marie Joseph Artaud (04/09/1896_Marcelha_França_04/03/1948_Paris__França) Escritor, ator, poeta, dramaturgo,roteirista e diretor teatral

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