"O mundo é uma dança de seres viajando, processo contínuo sem conclusão. Deus não é conclusivo, um cálculo, um esquema. Deus é movimento, a viagem. Os sufis entendem que somos todos viajantes. Estamos todos de passagem, não podemos nos fixar em nada no caminho. Quem sabe temos tempo apenas para uma noite? Não devemos nos fixar. O mundo é uma dança. O mundo é uma taberna onde cruzam os caravansarais. Deus é um dançarino. Deus dança. Deus sopra seu hálito divino e tudo se movimenta. A dança de Deus é um ato de renovação contínua. Aquilo que não muda está em oposição a Deus, não pertencendo ao Seu mundo. A origem de tudo é o movimento. A personificação do movimento é o ato da dança, da mudança"
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A consciência do processo de criação pela experiência, ao penetrar no movimento interno, envolvendo-se total e organicamente com o corpo em todos os níveis – intelectual, físico ou intuitivo – promove a construção de uma arte que se comunica com seu tempo.
A intuição é vital para a situação de aprendizagem e, infelizmente, é muito negligenciada.
Não quero afirmar que o mágico e o onírico formam um artista. Na verdade, técnica e imaginação precisam caminhar juntas, como afirmamos em dança: “não baixa o espírito santo”.
Antoine Artaud (1896/1948) – poeta, ator, escritor, dramaturgo, roteirista e diretor de teatro francês – uma das minhas principais fontes de pesquisa sobre a metafísica, para meu desespero, não nos explicitou o processo para se chegar a uma arte que nos convide a aguçar os sentidos e a experiência coletiva, onde não há separação entre público e platéia.
A propósito: minha intenção é fazer o público sonhar. Que a relação espaço/tempo seja elevada a um patamar diferenciado. Prefiro a idéia de colocar a platéia para flutuar, dançar comigo, participar da experiência da dança, do movimento profundamente conectado, sem a dimensão da análise literal ou apelo da razão cartesiana.
Não estou falando de uma dança burra, mas de uma dança que seja tão impregnada de verdade e beleza que “ultrapasse o entendimento”. O processo para se chegar a esse estado de presença em cena necessita de total disciplina e contato consigo mesmo. Na minha opinião, um trabalho que pretenda a espiritualidade exi-ge renúncia e princípios éticos que, no meu caso, tem referenciais do oriente.
Temos muita arrogância na arte. Não quero somar nesse sentido: meu principal elemento motivador é criar uma dança sublime e onírica. Uma dança que exija disciplina, treinamento corporal e espiritual para, em cena, provocar reflexão e encantamento. E porque não, dúvida e questionamentos sobre a condição humana?
E mais: uma dança que questione o próprio ato de dançar. Que questione a própria dança.
Ninguém – eu inclusive – detém o monopólio do belo. Um dos meus compromissos de pesquisa, é descobrir meus próprios símbolos, minha própria assinatura.
Reverencio cada detalhe que aprendo com o estudo universal da dança. Reverencio todos os profissionais que me ensinaram um pouco deste conhecimento. O que busco tem essa marca e iniciação.
Para mim, o palco é sagrado e a minha platéia primeira são os deuses da arte.
Tenho essa questão tão clara dentro de mim, porque faço da dança a minha prece e a minha expressão de alma, meu Dharma. Me reinvento, me redescubro. Também retorno ao ponto zero.
Novo Ciclo. Nova busca. Outra estética. Sem abrir mão do passado, da semente plantada.

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