"ARTE COMO VEÍCULO"

(...)Meu último espetáculo, como diretor de teatro, é intitulado ‘Apocalypsis cum figuris’. Foi criado em 1969 e suas representações terminaram em 1980. Desde então eu não fiz nenhum espetáculo. ‘Ação’ não é um espetáculo. Não pertence ao domínio de arte como apresentação. É uma obra criada no campo de arte como veículo. É concebida para estruturar, em um material ligado às artes cênicas, o trabalho em si dos fazedores (doers). Testemunhas, observadores de fora, podem estar presentes ou não. Depende de várias condições que, sob circunstâncias diferentes, esta abordagem exige. Quando eu falo de arte como veículo, eu me refiro à verticalidade. Verticalidade- nós podemos ver este fenômeno em categorias de energia: energias pesadas mas orgânicas (ligadas a forças vitais, a instintos, a sensualidade) e outras energias, mais sutis. A questão da verticalidade quer dizer passar de um nível, por assim dizer, grosseiro, em um certo senso, poderíamos dizer um “nível cotidiano”, para um nível de energia mais sutil ou até mesmo para a conexão mais elevada. Eu simplesmente indico a passagem, a direção. Aqui, há outra passagem: se alguém se aproxima da conexão mais elevada—quer dizer, falando em termos de energia, se a pessoa chega a energia muito mais sutil—então também há a questão da descida, trazendo este algo mais sutil para a realidade mais comum que é ligada à densidade do corpo. (...) Em relação à verticalidade a questão é não renunciar a partes de nossa natureza—tudo deve reter seu lugar natural: o corpo, o coração, a cabeça, aquilo que está “debaixo de nossos pés” e aquilo que está “sobre a cabeça.” Tudo como uma linha vertical, e esta verticalidade deveria acontecer entre a organicidade e o estado de atenção - estado de atenção quer dizer a consciência que não está ligada à linguagem (a máquina de pensar), mas à Presença. (...) O que uma pessoa pode transmitir? Como e para quem transmitir? Estas são questões que toda pessoa que é herdeira de uma tradição se coloca, porque essa pessoa herda também, de certa forma, o dever transmitir aquilo que recebeu para si. Que participação tem a pesquisa em uma tradição? (...) Uma vertente do Budismo Tibetano diz que uma tradição pode viver se a nova geração for um quinto além da geração precedente, sem esquecer ou destruir suas descobertas. (...) No campo de arte como veículo, se eu considerar o trabalho de Thomas Richards em ‘Action’, com as antigas canções vibratórias e com todo este vasto terreno que liga a tradição que ocupa as pesquisas aqui, eu observo que a nova geração já avançou em relação à precedente. Texto sem nome por Jerzy Grotowski, Pontedera, Itália, 4 de julho, 1998, de acordo com o desejo de Jerzy Grotowski este texto foi publicado postumamente:[1]

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