A POTÊNCIA DO RISO

Quando comecei a estudar teatro tinha um exercício que eu adorava fazer e segui fazendo em cada oficina de teatro, na faculdade e cursos. Até quando ensino teatro, em algum momento ele aparece para ser feito no contexto da aula. Esta semana fui surpreendida por este exercício numa aula de Biodança. Eu já tinha feito inúmeras vezes na biodança, por que neste sistema é possível experimentar em seu contexto elementos corporais pertencentes a outras linguagens, sendo o movimento adaptado à abordagem da aula.O que me chamou a atenção foi a maneira inusitada que foi abordado este movimento, tão significativo de nascer como uma planta, ou árvore. Mas neste gestual simbólico, a proposta era para renascer a partir de um movimento de oposição. Sempre que eu fiz eram duas pessoas, ou uma te incentivando e te ajudando a nascer, desta vez era diferente, a mesma posição fetal, e as duas pessoas faziam oposição, teria que ter vontade e força interior e vontade de nascer. Esse momento de oposição, foi criando uma vontade,um desejo, uma fúria em mim, que quando me desvencilhei dos obstáculos e nasci, saiu um grito primal das minhas entranhas, o grito não vinha da garganta, saia do ventre e foi forte e selvagem.Depois fiquei parada como um bebê imaturo e sem saber andar, foi necessário reaprender a dar os primeiros passos, e as minhas duas amigas no exercício foram de uma sensibilidade incrível e até ganhei as estrelas ofertadas por elas, por que me levaram para fora da sala, na varanda e me mostraram o céu estrelado. Cheguei em casa, muito introspectiva e ao mesmo tempo dando risada, por que no final da aula nossa facilitadora nos fez dar muita risada. No entanto, de madrugada senti uma dor profunda no meu útero, senti uma liberação de alguma coisa misteriosamente secreta para mim mesma. E foi assim que pensei na Deusa Baubo, antiga deusa Grega do ventre, da sexualidade e do riso. Inclusive ela é representada através de um ventre. Segundo a mitologia, quando Deméter era a deusa mãe da terra, protegia o planeta e sempre fazia florescer e ter abundância, passeando pelos prados junto de sua filha a Perséfone. Quando sua filha foi sequestrada pelo Deus Hades dos infernos, Deméter caiu em profunda depressão e a terra ficou estéril. E um dia Deméter em sua busca desesperada para encontrar sua filha, foi parar num lugar chamado Eleusis e encontrou a deusa Baubo. E Baubo vendo-a desesperada começou a dançar em volta dela e levantou a saia e mostrou o seu ventre para ela, a sua vulva. As duas caíram na gargalhada e Deméter entre risos a abraçou e disse que percebeu que como deusa da terra não poderia ser destruidora e sim transformadora. E Baubo continuou contando histórias picantes e os risos foram tão curadores que Deméter adquiriu forças para continuar lutando para encontrar sua filha. A terra riu com as Deusas e a terra floresceu.Através da alegria e do riso, ampliamos a unidade na certeza do riso e da alegria, como um grande caminho para suavizar nossos obstáculos e passamos a celebrar a vida, com alegria, apesar de sempre haver a possibilidade da dor nos visitar. Baubo vive em cada uma de nós, é a capacidade que todas nós temos de nos levantar e seguir em frente depois de um momento triste. De apostar no riso, como auxiliar na cura de nossas depressões. Baubo nos faz ainda entender como é poderoso, belo e mágico o corpo feminino.

Comentários

  1. Lindo o texto que relata uma experiência lúdica e sofrida, porque exige a reflexão profunda sobre o corpo, o ser, o estar no mundo e disso advém mesmo um despertar de emoções adormecidas e até sensações físicas inesperadas. A mitologia é rica em lições e exemplos sobre os elementos essenciais da vida humana , o ser e o não ser, permanência e transitoriedade, virtude e vício e mais. A vivência emocional permite aproximar-nos de outros mundos que fazem parte desse mesmo Universo! Parabéns!

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  2. Verdade Jacira, o corpo é um manancial de emoções, um arquivo de memórias, o lugar da transcendência e da conexão com o divino que habita em cada um de nós.

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