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MIRA BAI

MIRA BAI

SRI SWAMI SIVANANDA

© Tradução para o Português de
SWAMI KRISHNAPRIYANANDA SARASWATI

SOCIEDADE INTERNACIONAL GITA DO BRASIL

1. Introdução
Mira Bai é considerada uma encarnação de Radha (consorte de Krishna). Ela nasceu em Samvat, no ano de 1557 ou em 1499, no vilarejo de Kurkhi, próximo a Merta, um pequeno estado em Marwar, Rajastan. Mira foi filha de Ratan Singh Ranthor, e neta de Dudaji de Merta. A família Ranthor era grande devota do Senhor Vishnu. Mira Bai foi ensinada sob a influência Vaishnava (devotos de Vishnu), a qual moldou a sua vida no caminho de devoção em direção ao Senhor Krishna. Ela aprendeu a adorar o Senhor Krishna desde a sua infância. Quando ela tinha quatro anos de idade, manifestou suas tendências religiosas. Certa feita, houve uma procissão de casamento defronte a sua casa. O noivo estava belamente trajado. Mira, que era apenas uma criança, viu o noivo e disse para a sua mãe inocentemente: “Querida mãe, quem é o meu noivo?”. A mãe de Mira sorriu e disse de brincadeira, meio sério, apontando em direção a imagem de Sri Krishna e disse: “Minha querida Mira, o Senhor Krishna – esta bela imagem – é o seu noivo”. A menina Mira começou a amar muito o ídolo de Krishna. Ela passava muito do seu tempo banhando e vestindo a imagem; ela adorava a imagem, e dormia com a imagem. Ela dançava diante da imagem em êxtase, e cantava belíssimas canções diante da imagem. Ela costumava falar com o ídolo de Krishna como se Ele fosse uma pessoa.


2. O Casamento de Mira
O pai de Mira arranjou o casamento dela com Rana Kumbha de Chitore, em Mewar. Mira foi uma esposa obediente; ela realizava as ordens do seu esposo de forma irrestrita. Após realizar as obrigações da casa, ela ia até o templo do Senhor Krishna, adorá-lO, cantando e dançando diante da deidade. Mira abraçava a pequena imagem, tocava a Sua flauta e conversava com ela. A sogra de Mira, e outras senhoras da casa, não gostavam do seu estilo, na medida em que elas eram mundanas e invejosas, de modo que todas elas estavam perturbadas com ela. A sogra de Mira forçou-a a adorar Durga, e chamava a atenção dela freqüentemente. Mas Mira sustentava de forma adamantina, dizendo: “Eu dei a minha vida para o meu querido Senhor Krishna!”. A cunhada de Mira, Udabai, fez uma conspiração, e começou a difamar a inocente Mira. Ela disse a Rana Kumbha que Mira tinha um amor secreto, e que ela, por seus próprios olhos, tinha testemunhado Mira no templo com seu amante, e que ela mostraria para ele a pessoa se ele a acompanhasse numa noite. Ela acrescentou que Mira, por sua conduta, tinha maculado imensamente a reputação da família de Rana de Chitore. Rana Kumbha, por isso, ficou muito irado. Ele, imediatamente, correu com a espada na mão para o interior dos aposentos de Mira. Felizmente, Mira não estava lá. Um parente bondoso de Rana apontou para ele e disse: “Olhe aqui, Rana! Não seja apressado. Você irá se arrepender mais tarde. Leve bem isso em consideração. O que você escutou agora talvez seja apenas um rumor bobo. Por causa de inveja absoluta, algumas mulheres estão fofocando uma história contra Mira, para destrui-la. Fique calmo agora”. Rana Kumbha cedeu ao sábio conselho de seu parente. A irmã de Rana levou-o para o templo, no silêncio da noite. Rana Kumbha quebrou-o, abrindo a porta e entrando apressadamente, e encontrou Mira sozinha no seu modo de êxtase falando com o ídolo.

Rana disse para Mira: “Mira, com quem você está falando agora? Mostre-me este seu amante!”. Mira respondeu: “Ele está sentado aqui – meu Senhor – o Nanichora que roubou meu coração”; e desmaiou em seguida. Houve uma fofoca de que Mira tinha se misturado livremente com os Sadhus. Ela, sem dúvida, tinha grande admiração pelos Sadhus e se associava livremente com eles. Mira jamais deu bola para esses escândalos insignificantes, mantendo-se serena.

3. Mira foi muito perseguida
Mira foi perseguida em várias maneiras por Rana e seus parentes. Ela foi tratada da mesma maneira que Prahlada fora tratado por seu pai Hiranyaskashipur. O Senhor Hari defendeu Prahlada. Com Mira, Sri Krishna sempre ficou ao seu lado. Uma vez, Rana enviou uma cobra dentro de uma cesta para Mira, com uma mensagem que havia uma guirlanda de flores dentro. Mira tomou um banho e sentou-se para a adoração. Após terminar a sua meditação, ela abriu o cesto e encontrou dentro dele uma adorável estatueta de Sri Krishna e uma guirlanda de flores. Depois, Rana enviou para ela um copo com veneno, com a mensagem de que continha um néctar. Mira ofereceu para o Senhor Krishna e tomou como sendo Sua Prasad; como sendo, de fato, um néctar para ela. Então Rana enviou uma cama de pregos para ela dormir. Mira terminou sua adoração a Krishna e deitou-se na cama de pregos. E veja! A cama de pregos se transformou numa cama de rosas.

Quando Mira foi torturada pelos parentes do seu marido, ela enviou uma carta para Tulsidasji, e pediu o conselho do santo homem. Ela escreveu para ele assim: “Todos os meus parentes me importunam, porque eu fico no meio dos Sadhus. Eu não posso continuar minhas práticas devocionais em casa. Eu fiz Giridhar Gopal, meu amigo, desde minha infância. Eu estou fortemente apegada a Ele. Eu não posso desapegar-me d’Ele agora”. Tulsidasji enviou uma resposta: “Abandone aqueles que não adoram Rama e Sita como se eles fossem seus inimigos, mesmo que eles sejam seus parentes queridos. Prahlada abandonou Seu pai; Vibhishana deixou seu irmão Ranava; Bharata deixou a sua mãe; Bali abriu mão até mesmo do seu Guru; as Gopis, as moças de Vraja, deixavam os seus maridos para chegar ao Senhor. Suas vidas eram todas alegres por terem feito isto. A opinião dos sagrados santos é de que unicamente a relação com Deus, e o amor por Deus é verdadeiro e eterno; todos os outros relacionamentos são irreais e temporários”.

4. Sua chegada em Vrindavana
Ela chegou em Vrindavana pedindo por comida, e por adoração no templo de Govinda Mandir, o qual, desde então, tornou-se famoso, e agora é um local de peregrinação. Seus devotos de Chitore vieram a Vrindavana para ver Mira. Rana Kumbha veio até Mira, disfarçado de mendigo, revelando-se a si mesmo, e arrependido por suas ofensas anteriores, e ações cruéis. Mira imediatamente prostrou-se diante do seu marido.

Jiva Goswami era o mais importante dos Vaishnavas em Vrindavana. Mira procurou ter um Darshan de Jiva Goswami. Ele negou-se a vê-la, enviando um recado para Mira de que ele não permitia nenhuma mulher na sua presença. Mira retorquiu: “Todos em Vrindavana são mulheres. Há apenas Giridhar Gopal é Purusha. Hoje eu apenas vim ver se havia outro Purusha além de Krishna em Vrindavana”. Jiva Goswami ficou envergonhado e viu que Mira era uma grande devota. Ele imediatamente foi ver Mira e prestou seus devidos respeitos.

A fama de Mira espalhou-se para todos os lugares. Deste modo, muitas princesas e rainhas vinham ter com ela; assim, muitas Ranis, Kumaris e Maharanis apareciam no palco deste mundo e desapareciam. Como é que apenas a rainha de Chitore era lembrada? Por causa da sua beleza? Por causa da sua habilidade poética? Não. Por causa da sua renúncia e profunda devoção ao Senhor Krishna, e realização em Deus. Ela ficava face a face com Krishna. Ela conversava com o Senhor Krishna; comia com Ele, seu Amado. Ela bebeu Krishna-prema-rasa. Ela cantava do fundo do seu coração a música de sua alma; a música do seu Amado, sua exclusiva experiência espiritual. Ela cantava músicas de rendição e Prema (amor puro por Deus). Mira tinha uma maravilhosa visão cósmica; ela via Krishna nas árvores, nas pedras, nas plantas trepadeiras, nas flores, nos pássaros e em todos os seres – em tudo. Enquanto houver o nome de Krishna haverá o nome de Mira também.

5. Uma personalidade ímpar
É extremamente difícil encontrar um paralelo desta maravilhosa personalidade, Mira: uma santa, uma filósofa, uma poetiza e uma sábia. Ela foi um gênio versátil e uma alma magnífica. Sua vida teve um encanto singular, com extraordinária beleza e maravilha. Ela foi uma princesa, mas abandonou os prazeres e as luxúrias incidentais desta alta posição, e escolheu, em vez daquilo, uma vida de pobreza, austeridades, Tyaga, Titiksha e Vairagya. Apesar de ela ser uma delicada jovem moça, ela penetrou na perigosa jornada do caminho espiritual no meio de várias dificuldades. Ela se submeteu a várias experiências com destemida coragem e intrepidez. Ela se manteve adamantina na sua resolução. Ela possuía uma força-de-vontade gigante. As músicas de Mira difundem fé, coragem, devoção e amor por Deus nas mentes dos leitores; inspirando os aspirantes a tomarem o caminho da devoção, produzindo neles uma maravilhosa vibração e derretendo os corações.

A vida terrena de Mira foi cheia de aborrecimentos e dificuldades. Ela foi perseguida, atormentada e, mesmo assim, ela se manteve de pé num espírito destemido, com a mente equilibrada totalmente internalizada, por sua força de devoção e pela graça do seu amado Krishna. Apesar de ela ser uma princesa, ela pediu esmolas, e viveu algumas vezes apenas de água. Ela levou uma vida de perfeita renúncia e auto-rendição.

Mira tinha Raganuga ou Ragatmika Bhakti. Ela jamais se importou com as críticas das pessoas, e com as injunções dos Shastras. Ela dançava nas ruas; ela não fazia rituais de adoração. Ela possuía amor espontâneo pelo Senhor Krishna. Ela não praticava Sadhana-Bhakti; desde tenra infância ela derramava amor por Krishna. Krishna foi seu marido, pai, mãe, amigo, parente e Guru. Krishna foi seu Prananath. Mira tinha terminado os modos preliminares de adoração na sua vida anterior.

Mira era destemida em sua natureza; era simples nos seus hábitos; sua disposição era alegre; amável no seu procedimento; e graciosa no seu comportamento, e muito elegante na sua conduta. Ela estava imersa em si mesma no amor de Giridhar Gopal. O nome de Giridhar Gopal estava sempre em seus lábios; até mesmo dormindo ela tinha o seu ser e vivia em Krishna.

6. Maha-Bhava de Mira
Na sua divina embriaguês, Mira dançava em locais públicos. Ela não possuía idéias sexuais. O seu exaltado estado não pode ser descrito de forma adequada em palavras. Ela estava mergulhada num oceano de Prema. Ela não possuía consciência do seu próprio corpo e do que acontecia ao redor; quem pode medir a sua profunda devoção? Quem poderá entender seu estado interno de Premamaya, de Maha-bhava? Quem pode medir a capacidade do seu imenso coração?

Mira flutuava na fragrância da devoção em todo o lugar. Aqueles que entravam em contato com ela eram afetados por sua forte corrente de Prema. Mira foi como o Senhor Gauranga. Ela era uma incorporação do amor e da inocência. Seu coração era um templo de devoção. Sua face era uma flor-de-lótus de amor. Ela era bondosa no seu olhar, amorosa no seu falar, alegre nos seus discursos; tinha poder na sua falar e ardor nas suas canções. Que dama maravilhosa! Que maravilhosa personalidade! Que figura encantadora!

Os místicos sons de Mira agem como um bálsamo calmante nos corações feridos, e os nervos cansados daqueles que trabalham duramente no mundo com sobrecarga em suas vidas. As doces melodias de suas músicas exercem uma influência benigna nos ouvintes, removendo a discórdia e a desarmonia, e os acalma até o sono. A linguagem de amor de Mira é tão poderosa que mesmo um completo ateu será tocado pelos seus sons devocionais.

Mira realizou bem a sua parte no teatro do mundo. Ela ensinou ao mundo o caminho do amor a Deus. Ela remou o seu barco com habilidade num mar tempestuoso das dificuldades familiares e alcançou a outra margem da suprema paz e absoluto destemor, ou o reino do amor supremo. Ela pertencia ao belo sexo feminino e mesmo assim, como era destemida e corajosa! Apesar de ela ser jovem, ela aguentou as perseguições silenciosamente. Ela sofreu cortantes insultos e críticas sarcásticas mundanas bravamente. Ela deixou uma impressão indelével no mundo e o seu nome passará para a posteridade. De Vrindavana, Mira foi para Dwaraka. E lá ficou, totalmente absorvida na imagem do Senhor Krishna no templo de Ranchod.

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