"TEMPOS MODERNOS"

Sou voluntária de uma ONG que tem como missão ajudar e promover conforto emocional e saúde mental a pacientes com depressão e pessoas que sofrem emocionalmente e as que têm tendência ao suicídio. O grupo é formado por vítimas da desigualdade social alarmante no Brasil.Nossos governantes não atendem esta demanda no sistema de saúde público altamente falido. Esta organização é literalmente não governamental, ela funciona com o apoio de voluntários, psicólogos, e muitos profissionais que atuam fazendo palestras, atendimentos em grupos e individuais.Tudo de graça, e os atendimentos acontecem nas dependências de uma Igreja, sedida gentilmente pelo padre da paróquia. Esta semana fui atender um grupo de vítimas de assédio moral no trabalho. Um grupo pequeno, porque sofre boicote das empresas que não querem associar sua imagem a este assunto tão delicado. Infelizmente quem procura o grupo, já sofreu humilhação, está com a sua dignidade ferida e desempregado, e além da pressão econômica e a falta de espaço no mundo está emocionalmente se sentindo desqualificado e sem forças para reverter a situação. Primeiro eu levei o teatro, eu acredito no poder das respostas incríveis que o corpo dá, e representar através do jogo, têm o poder de ressignificar modelos de autoritarismos muito arraigados nesta "casa grande senzala" que é o Brasil. Quero destacar um exercício que foi muito marcante para mim e para os participantes. Eu dei uma folha para eles e pedi que cada um andasse pela sala imaginando uma situação onde se sentiu pequeno, depois fizesse com o corpo a posição e em seguida escrevesse a palavra que resumia esta situação. Depois pedi que todos andassem expondo sua ferida para que todos vissem. E assim todos caminharam mostrando suas marcas, rótulos e como se sentiam. Depois eu pedi para que eles virassem a página e agora caminhassem pelo espaço pensando num momento em que eles se sentiram grandes e depois parassem na posição e depois de escrito, que experimentassem caminhar novamente expondo suas alegrias, emoções de amor e júbilos. Foi uma vibração bela, ver aqueles corpos sofridos e machucados pela vida, caminhando com dignidade.Dava para ver o brilho nos olhos a postura e o amor exalando na sala. No final nos abraçamos. Observei um participante que fez um depoimento sobre como se sentia pequeno, a palavra gay foi a escolhida por ele e na nossa roda de partilha, ele me disse que o Brasil é muito homofóbico e que ele assume o que ele é e se sente triste quando não é sua competência que é avaliada. Isso me deu uma sensação de revolta.Como que alguém pode ser julgado por ser o que é? De que adianta tanta tecnologia aproximando as pessoas e automatizando as forças no trabalho se a condição humana continua mesquinha? Até quando vamos assistir estarrecidos grandes tragédias no mundo, porque o sistema de saúde de certos países não valorizam a saúde emocional e mental? O que aconteceu no Brasil e nos Estados Unidos é a prova cabal. Não adianta acreditar que a crise é apenas econômica e ética. Temos uma crise baseada na ignorância dos perigos de entregarmos o poder nas mãos de psicopatas.Eu voto inclusive em exames psicológicos em pessoas que pretendem abraçar a política, não é possível que essa ausência de remorso e empatia, e a total sofisticação em saquear o Estado numa ganância incomensurável de poder não seja algo deletério. Pode ser uma pista para entender a mente de um Stalin, Hitler,os militares no Brasil,os banqueiros insanos por lucro por exemplo. Não estou afirmando que todos que estão no poder precisam de tratamento, e muito menos afirmando que uma empresa que desqualifica seus funcionários com toda a sorte de humilhações que se trata de pessoas num estado mental deplorável. Mas eu só queria entender o porquê de uma pessoa assumir um posto de comando e se sentir no direito de maltratar um funcionário que o está servindo. Olhei para aquele grupo e senti tristeza por ver jovens cheios de inteligência, capazes de trabalhar e levar uma vida feliz, bloqueados nos seus destinos, porque sofreram assédio moral.No final eu que recebi, esta é a maravilha de ser voluntária, aprender e ver que apesar de tudo, eles estavam lá olhando para esta situação e abertos para aprender a lidar com este mundo doente com muita luz. A arte é um grande canal de cura. Eu sonho com o dia em que a arte,a cultura e as ideias tomaram o poder. Nesse dia o autoconhecimento será matéria obrigatória na escola, criar, sentir o corpo e desenvolver o sentimento de pertencimento será matéria prima nas escolas, o riso, o jogo e a liberdade de ser o que se é vai contar como base de qualquer formação. A vida precisa habitar a escola, a sombra precisa tirar o bolor desta educação caquética que não ensina ninguém a ter uma projeto de vida para ser feliz, parece que as escolas ensinam muitas vezes a cultura do controle social e do preconceito. Eu sei que existem professores que conseguem furar esta escola morta e transmitem vida.No entanto é preciso ter uma natureza muito sofisticada para não se deixar contaminar.Nossa sociedade precisa na minha opinião questionar,buscar, investigar novas maneira de convivência respeitando cada ser humano. Só assim teremos realmente uma cultura de paz.

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