DANÇAR O RITMO DA VIDA

A modernidade no ocidente criou a falsa ilusão de que a velocidade é o modo de vida mais inteligente. A indústria da publicidade e da mídia imediatista vendeu esse comportamento para criar necessidades ilusórias a cada segundo e a vida virou um grande programa de televisão, onde nós somos os personagens guiados.Me perdoem os acelerados mas andar devagar, parar no meio do caminho para observar a flores faz parte de mim. Eu sou daquelas que não assisti a filme americano quando é feito para provocar esta sensação de que se vivi mais correndo a mil por hora num carro, disputando espaço na pista, ação muita ação, carros explodindo e poucos diálogos, sentimento e pouca reflexão sobre a condição humana. Eu gosto mesmo é da estética oriental filmes Iranianos com os seus planos longos, muitos olhares e intenções, fim de tarde como destaque e muita cor . Ou os filmes europeus que primam pelo roteiro, a história dos personagens é que importam, não vejo filmes onde os efeitos especiais são os protagonistas. Eu sei que sou um corpo estranho nesse mundo acelerado onde tudo foi feito para acabar e ser substituído. E é mundial o mundo está assim, nem é uma questão de oriente-ocidente, mas aqui é o meu lugar, o meu chão.Preciso de silêncio e de andar sentindo o chão, ouvindo o som dos pássaros e respirando os cheiros. Quando danço faço um movimento de rito onde sem palavras e com a minha gestualidade simbólica e sutil desconstruo por alguns instantes esta vida veloz que não existe a pausa para contemplar. Não sou contra nada e muito menos julgo quem vive acelerado, mas meu mundo tem silêncio e muitos ritmos que podem ir do acelerado ao mais lento.O importante é respeitar o ritmo interno e não importa se você está devagar e todos estão acelerados, não importa se a piada demorou para ser entendida ou se aquela instrução precise ser dita novamente pausadamente.A música clássica por exemplo tem o andamento que é o tempo ou o grau de velocidade. É um universo de uma variação de velocidade infinita. Existe até nome, por exemplo o Allegro que vem do Italiano significa que o andamento musical é leve e ligeiro, tem o Allegreto para o andamento mais rápido e é mais lento que o presto que é extremamente rápido. O Allegro ma nom tropo é alegre mas não muito. Só para citar a riqueza de variações de velocidade para que fique claro que velocidade não é sinônimo de inteligência e modernidade. Outra versão ilusória é que ser lento e fazer pausa é coisa de velho e ser jovem é fazer tudo rápido como se o mundo fosse acabar hoje.Quando traduzimos esta experiência para o corpo na dança por exemplo temos a oportunidade de silenciar nossa ansiedade e pressão para acompanhar a velocidade imposta por nós para dar conta de atender as demandas do mundo. Muita gente não suporta nem ouvir um pensamento mais elaborado ou subjetivo, ou a velocidade do seu navegador ficar lenta, tem que conectar logo, rápido, agora. Respeito quem quer viver nessa loucura acelerada, mas eu preciso sentir meu ritmo e decidir se quero correr, parar, ser lenta, pausar ou acelerar. Se vivemos sempre lentos o tempo todo corremos o risco de atrasar sempre,cair no tédio,estacionar e não mudar o ritmo e até cair numa depressão e se somos acelerados demais perdemos o sabor das coisas que são feitas para desfrutar para degustar e saborear aos poucos.Perdemos uma forma linda feita por uma nuvem, perdemos o luar e as nuances de um olhar, de um gesto e o pensamento pode ficar acelerado, as emoções deixam de ser administradas, ficamos impulsivos, instáveis e se perde a riqueza da sincronicidade que é fundamental para entrar em sintonia com o outro. A dança nos ensina muito sobre o balé da vida, como encontrar o meu ritmo com o outro, os dois dançam juntos na vida. Conviver e sentir sintonia é isso. Eu posso desacelerar um pouco para sentir o ritmo do outro e vibrar na mesma emoção. Acredito que se o ser humano tivesse mais oportunidade de dançar os desencontros não seriam tão frequentes. Cada um com o seu ritmo no seu tempo, mas de vez em quando eu posso acelerar para acompanhar alguém que está lento, ou os dois podem encontrar um ritmo diferente mas que permita o encontro do humano. Esta é a poética do encontro que aprendi com o mestre Rolando Toro, criador da biodança.O fato é que o movimento feito com consciência revela ritmos, emoções, nuances sobre ser gente de verdade.

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