MERGULHO NAS ENTRELINHAS

Vivências e memórias corporaes O sacro e o profano A poética do cotidiano O sublime do gesto Minha avó era a guardiã da memória afetiva da família. Havia um baú, onde ela conservava seu acervo de fotos,minhas provas do jardim de infância e objetos da família. Ela colecionava fotografias dos mortos da família. Minha avó via os mortos. A morte era parte do cotidiano. No meu espetáculo BARAKA, no primeiro ato, faço um rito de abertura do espetáculo, inspirado na dança Butoh, a dança com a morte, um movimento para trás simbolizando o passado, os ancestrais, outro passo para frente significando o presente, o aqui e agora, as mãos são o sentimento de perda, um cruzamento ente a vida e a morte, um espaço não dito. Minha avó era um silêncio preenchido de significados. A vida que acontece dentro de mim, é o que me faz dançar. Dançar é sentir a vida para mim. Minha dança é esse baú de minha avó, quando danço expulso minhas memórias, meus fantasmas, solidão, dores e alegria. As pessoas sempre me perguntam o que ensino, que estilo, eu sempre me interrogo, quando foi que a dança ficou tão hermética e racional, a ponto de ser vendida em prateleira,claro que existem muitos espaços para se aprender a dançar com alma. Eu prefiro dizer que todos temos uma dança guardada dentro de nós, esperando para ser libertada, para ser lançada ao "infinito particular" de cada um. A criança dança sem medo de ser julgada, se está no rítmo, ela apenas deixa a música possuir o seu espírito e deixa o corpo sentir e a dança acontece. O tempo vai separando pessoas que dançam e que não dançam. Proponho um movimento onde dançar é acreditar na sabedoria do corpo e dançar memórias esquecidas, por exemplo, a dança da fluidez dentro da barriga da mãe, mergulhados no líquido amniótico, ou embalados no colo da mãe ao som da melodia da sua voz. Assisti o dvd do Mauro Senise,intitulado" Danças",a fotografia incrível do Walter Carvalho. Um saxofonista,músico incrível, com a participação da Débora Colker e do Ator Chico Diaz,foi emocionante. Tem uma dança onde ele coloca um colar no pescoço dela, um gesto cotidiano, com um acento poético avassalador. Delicadeza sublime. Eu gostaria que a dança fosse tão presente na nossa vida como o café da manhã. , As duas primeiras fotos são da Pina Baush

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